A aproximação da assessoria das duas candidaturas
em relação à coalizão de rentistas e financistas é evidente. E os programas na
essência são idênticos. Os coordenadores dos programas econômicos das
candidaturas de Aécio e Marina enfatizam uma política monetária mais austera. Armínio Fraga, pelo lado aecista e André Lara
Resende, pelo lado marinista têm propostas similares
“Ou há duas Marinas Silvas, ou há dois Aécios
Neves.” Assim o jornalista Jânio de Freitas, em artigo publicado na Folha de
S.Paulo, formula a constatação de que os programas de governo dos dois
principais candidatos de oposição a Dilma Rousseff na eleição presidencial são
tão semelhantes que, na essência, são idênticos.
Eu tenho escrito em coluna no Jornal do Brasil que
há dois grandes campos políticos em disputa no Brasil, o
social-desenvolvimentista e o neoliberal. Na esfera político-institucional,
isso se expressa na oposição entre PT e PSDB, os dois principais partidos de
cada um desses respectivos campos. Na verdade, trata-se de dois modelos de
capitalismo. Além das tendências estruturais da economia internacional, a área
de política fundamental para a conformação desses dois modelos é a política
macroeconômica, pois, por meio dela, o governo tenta influenciar o
comportamento de agregados econômicos, como crescimento, emprego, renda,
inflação e balanço de pagamentos. Três áreas são muito importantes na
macroeconomia, na perspectiva da ação governamental: as políticas monetária,
cambial e fiscal.
O coordenador do programa econômico de Aécio Neves
é Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central no segundo mandato de Fernando
Henrique Cardoso, investidor e executivo do setor financeiro. O núcleo de
assessores de Marina é composto por André Lara Resende e Eduardo Gianetti da
Fonseca (economistas liberais) e Neca Setubal (bilionária do Grupo Itaú). A
aproximação da assessoria dessas duas candidaturas em relação à coalizão de
rentistas e financistas parece ser evidente. As propostas de ambos caminham no
sentido de confirmar essa hipótese.
Os dois enfatizam uma política monetária mais
austera, visando, em um primeiro momento, alcançar o centro da meta de
inflação, hoje em 4,5%, e, em seguida, diminuir ainda mais. O instrumento de
combate inflacionário que o sistema de metas de inflação dispõe para a ação
política do Banco Central é a taxa de juros. A proposta desses dois candidatos,
portanto, implica uma elevação acentuada da taxa de juros, que favorece
rentistas e financistas. Ambos também propõem uma medida defendida pela
coalizão entre rentistas e financistas: a formalização da independência ou da
autonomia do Banco Central, a depender de como cada um denomina esse objetivo.
Mas não parece haver descontrole inflacionário no país. Veja-se o que diz matéria
recente da Folha de S.Paulo: “A média da inflação anual no período de Armínio
Fraga foi de 8,78%. No período Lula, foi de 5,79% nos dois mandatos. Sob Dilma,
a inflação média deve ficar acima de 6%”.
Por outro lado, como o aperto monetário impacta nas
despesas com a dívida pública, ou seja, no pagamento aos credores do Estado
(rentistas e financistas), a proposta de ambos enfatiza uma maior arrecadação
de superávit primário, a reserva orçamentária para pagar os juros. Em relação à
política de valorização permanente do salário mínimo, que implica benefícios
sociais e custos para os cofres públicos, Eduardo Gianetti da Fonseca disse o
seguinte: “Corrigir o salário mínimo pelo crescimento de dois anos atrás e o
IPCA do ano anterior não tem o menor sentido. Também é complicado reajustar o
benefício previdenciário pelo salário mínimo. Atrelar perpetuamente ao salário
mínimo não faz sentido” (Folha de S.Paulo, 21/10/2013). Ocorre que a
dívida líquida do setor público vem baixando ano a ano. Em dezembro de 2002,
era de 60,4% do PIB e caiu para 33,6% do PIB em dezembro de 2013. Durante esse
período, a taxa Selic, que é a taxa básica de juros da economia, tem-se mantido
em patamares compatíveis com a redução dos custos da dívida pública.
Em relação ao câmbio, um preço fundamental da
economia, a convergência liberal das duas propostas aposta na mera flutuação
cambial, não mencionando um problema muito sério: a valorização da moeda
brasileira resultante da entrada maciça de dólares. O programa de Marina Silva,
por exemplo, diz que vai “manter a taxa de câmbio livre, sem intervenção do
Banco Central”. Embora uma desvalorização muito acentuada da moeda não seja
recomendável, pelo impacto no aumento da inflação, a mera flutuação cambial,
sem alguns instrumentos administrativos de controle (operações de compra e
venda de dólares no mercado aberto, IOF etc.), pode apreciar muito a moeda e
agravar tendências à vulnerabilidade externa, a crises cambiais e a ataques
especulativos. Temos convivido desde 1994 com uma tendência de apreciação da
taxa de câmbio e de vulnerabilidade externa, e as políticas neoliberais têm
muita responsabilidade nisso. Retirar mecanismos de controle administrativo da
autoridade monetária reforçará a tendência à sobreapreciação.
Enfim, há uma convergência liberal nos principais
candidatos de oposição ao governo federal. Ela é evidente nas propostas de
política macroeconômica, a principal área de política que distingue os dois
grandes modelos de capitalismo em disputa, o social-desenvolvimentista e o neoliberal.
Marcus Ianoni é professor do Departamento de Ciência Política da
Universidade Federal Fluminense
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