Segundo
jurista, para discutir problemas de corrupção na companhia de petróleo
brasileira, é preciso lembrar que, em 1997, o governo do tucano fragilizou a
Lei de Licitações e regra sobrevive até hoje
"Governo
de FHC foi o mais entreguista da história do Brasil', diz Celso Antônio
Bandeira de Mello
São Paulo
– A discussão sobre problemas de corrupção da Petrobras precisa levar em
conta o momento em que o primeiro mandato do ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso fragilizou a Lei 8.666/1993 (a Lei de Licitações). Em 1997, o governo
FHC editou a Lei n° 9.478/1997, que autorizou a Petrobras a se submeter ao
regime de licitação simplificado, descaracterizando determinações da legislação
anterior. Para o jurista Celso Antônio Bandeira de Mello, esse foi o momento em
que "o governo Fernando Henrique colocou o galinheiro ao cuidado da
raposa". Em julgamento de mandado de segurança de 2006, o ministro Gilmar
Mendes, do STF (indicado por FHC), concedeu liminar validando a regra da lei do
governo tucano. Desde então, outras liminares confirmaram a decisão de Mendes,
mas o julgamento do mérito nunca ocorreu.
Na
opinião do jurista, embora tudo esteja "sendo feito para prejudicar o governo”
no escândalo da Petrobras e denúncias de corrupção, não existe risco de
impeachment.
Porém, as
dificuldades enfrentadas pelo PT e seus governos, de Luiz Inácio Lula da Silva
e Dilma Rousseff, no âmbito do Judiciário, são em grande parte decorrentes do
“desprezo” da esquerda pelo direito. "Tanto a esquerda não dá muita
importância ao direito que o Supremo (de hoje) praticamente foi composto, em
boa parte, por governos do PT. E, no entanto, como é que o Supremo se comportou
no chamado mensalão? Condenou, não apenas o Genoino, mas o Dirceu de uma
maneira absurda”, diz.
Porém, na
opinião do jurista, a partir de agora a esquerda vai ser obrigada a dar mais
atenção a aspectos jurídicos ao governar.
Na atual
composição do STF, nada menos do que sete ministros foram indicados por Lula ou
Dilma: o ex-presidente indicou o atual presidente da corte, Ricardo
Lewandowski, além de Cármen Lúcia e Dias Toffoli. Os nomes de iniciativa da
presidenta são Luiz Fux, Rosa Weber, Teori Zavascki e Luís Roberto Barroso.
Leia
entrevista concedida à RBA (Revista Brasil Atual).
Qual sua
opinião sobre a “tese” do impeachment, aventada politicamente nos corredores do
Congresso, por alguns juristas e alimentada pelos jornais?
Entre os
juristas, só vi falar a respeito o Ives Gandra.
O senhor
leu o parecer?
Vi aquele
artigo do jeito que saiu, por ele mesmo publicado na Folha. Eles
perderam a eleição, ficaram aborrecidíssimos – o que se compreende. O que não
se compreende é esse tipo de reação de quem, digamos, dá vontade de dizer: vai
chorar na cama que é lugar quente. Eles reagiram dessa maneira intempestiva.
Não estou muito impressionado com isso, porque para impeachment é preciso muita
coisa. Não basta um artigo que alguém escreva e eventualmente algumas pessoas
insatisfeitas fazerem menção a isso. Não houve a meu ver nada suficiente para
justificar um impeachment, assim como não houve também no Congresso.
Impeachment não é assim, “eu não fiquei satisfeito com o resultado das
eleições...” Não creio que vá muito pra frente isso, embora eles tenham por eles
o Ministério Público e a polícia. A coisa mais difícil de controlar é a
polícia.
As
informações são vazadas seletivamente...
Tudo está
sendo feito para prejudicar o governo. Se formos falar nesse negócio da
Petrobras, isso é antiquíssimo. Aliás, qualquer pessoa que pegar meu Curso de
Direito Administrativo (editora Malheiros) vai ver que lá está escrito com
todas as letras que o governo Fernando Henrique colocou o galinheiro ao cuidado
da raposa. Ainda no governo daquele senhor, ele baixou uma medida para as
estatais escaparem da Lei de Licitações, a lei 8.666. Essa medida foi
autorizada às empresas estatais, que são as grandes realizadoras de obras
públicas. A partir do momento em que o governo autoriza as estatais a
regulamentarem suas compras, portanto retira a força de Lei de Licitações, o
que está fazendo? Entregou o galinheiro à raposa. Então a questão da Petrobras
é coisa antiga...
Lembrando
o julgamento da Ação Penal 470, ela mudou alguns paradigmas e introduziu a
questão da judicialização da política. Considerando isso, o senhor acha
plausível a possibilidade de impeachment de Dilma?
Eu não
acho, sinceramente. Acho que existe um escândalo e, no fundo, eles gostariam
que algum jurista respondesse aquele artigo (de Ives Gandra), para colocar esse
tema em pauta. Mas não se deve, na minha opinião. Tanto que nenhum jurista
respondeu. Você vê que houve um silêncio de morte. Em geral há muito poucos
juristas, de nomeada, de direita. Quase nenhum. Os juristas são de centro, de
centro-esquerda, mas não são de direita. Não tem. Sobretudo jurista de direita
que seja nacionalmente ouvido, respeitado. É mais raro ainda. Um falou, e ficou
nele. E os chamados juristas de centro ou centro-esquerda nem ao menos
responderam, não deram bola.
O
presidente do PT falou em coletiva, na última semana, sobre violação de
direitos fundamentais na Operação Lava Jato. Pessoas serem acusadas e presas
sem provas, como até o ministro Marco Aurélio do Supremo comentou...
Na
verdade, o que aconteceu desde antes do chamado mensalão – e o mensalão foi uma
prova disso – é que a esquerda tem um defeito, a meu ver: é o desprezo pelo
direito. A esquerda não dá muita importância aos aspectos jurídicos. Tanto não
dá que o Supremo (de hoje) praticamente foi composto, em boa parte, por
governos do PT. E, no entanto, como é que o Supremo se comportou no chamado
mensalão?
Vou citar
um caso paradigmático: condenou, não apenas o Genoino, mas o Dirceu de uma
maneira a meu ver absurda. E tão absurda que dois expoentes da direita, a
saber, Ives Gandra da Silva Martins e depois Cláudio Lembo – que aliás é um
excelente constitucionalista, um jurista de muito valor –, os dois disseram que
a condenação do Dirceu foi sem provas. Foi absolutamente sem prova. Foi tão
escandalosa que essas duas pessoas insuspeitíssimas se manifestaram nesse mesmo
sentido. O PT e a esquerda, de modo geral, não dão a menor bola pro direito.
Agora vão ser obrigados a dar.
O que
seriam atitudes que indicariam levar o direito em consideração, pela esquerda?
Na
escolha das pessoas já se vê que não tiveram cuidado. Tanto que escolheram
pessoas que foram capazes de condenar sem prova. Eles queriam pegar o Lula, mas
era demais, porque era mais fácil cair tudo. Então pegaram quem estava mais
alto abaixo do Lula: Dirceu.
Nesse
sentido, o senhor considera que Dilma pode ser “pega”?
Acho que
esse clima alucinado já passou. Eu tenho dito e repito: no Brasil não há
liberdade de imprensa, há meia dúzia de famílias, se tanto, que controlam os
meios de comunicação. As pessoas costumam ingenuamente imaginar que esses meios
de comunicação têm por finalidade informar as pessoas. Não têm, são empresas,
elas têm por finalidade ganhar dinheiro. Portanto, têm que agradar aqueles que
os sustentam. E quem são? Os anunciantes. Nunca vão ter isenção. Pelo menos não
num país como o nosso.
Em países
desenvolvidos têm muitas fontes de informação, o cidadão lê livros, vai ao
teatro, ao cinema, ele se ilustra. Em país subdesenvolvido, não existe essa
ilustração. Então, o que está escrito nesses meios de comunicação entra como
faca na manteiga na cabeça da classe média alta, que é muito influente. O povão
não liga, mas a classe média alta liga. E quando é muito insistente, vai se
generalizando até para o povo. A eleição (de 2014) foi apertada, por isso estão
usando esses expedientes. Se tivesse sido uma vitória esmagadora como a do
Lula, não iam se atrever.
Curioso
que o parecer de Ives Gandra é de José de Oliveira Costa, advogado de FHC...
Pois é,
mas não é para estranhar. Porque o governo desse Fernando, o que não foi defenestrado,
foi o governo mais entreguista da história do Brasil. Não há exemplos na
história, que eu saiba, de um entreguismo tão deslavado quanto no governo dele.
Portanto, desse lado pode se esperar tudo.
Em 2018,
a eleição promete ser dura, não?
Promete
mesmo ser muito dura. Daqui até lá tem muita água pra correr debaixo da ponte.
Ainda é cedo, eu não sei como vai ficar.
A
Petrobras sempre foi atacada como pretexto para se atingir governos que
desagradam à elite...
Vou dar
uma resposta muito pessoal: se eu tivesse dinheiro pra investir era ação da
Petrobras que eu ia comprar. Eu creio que ela vai se levantar, que tudo isso é
onda. É política, e política dos derrotados, mas os derrotados têm em favor
deles todos os meios de comunicação. Não estou falando da Veja, porque a Veja
nem considero que é veículo de imprensa, é um veículo, digamos, de mera
publicidade. Nós já vivemos situação pior, porque hoje é esse grupinho, mas
houve um momento em que o Chateaubriand controlava tudo. Era pior ainda. Hoje
temos um grande respiradouro, que é a internet. Eu tenho uma relação de uns 20
sites ou mais que, se achar necessário, recorro a eles. Vão da extrema direita
à extrema esquerda, para eu poder me sentir mediocremente informado.
Completo
dizendo o óbvio. Quando você vai para a França, por exemplo, os hotéis de
alguma qualidade colocam à disposição dos hóspedes dois jornais. O Le Monde,
tido como de centro-esquerda, e o Figaro, tido como de centro-direita. Mas se
ler um ou ler outro, você continua devidamente informado. Nenhum deles te
engana. Eles têm a linha deles. É normal que haja pessoas de direita, de
esquerda, de centro, de tudo. Nenhum problema que tenham a linha deles. Mas no
Brasil não é assim. No Brasil a imprensa faz tudo pra te enganar.
http://www.redebrasilatual.com.br/politica/2015/02/bandeira-de-mello-foi-fhc-quem-colocou-raposa-para-cuidar-de-galinheiro-na-petrobras-2905.html
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